Entrevista com Cleuzany Lott
A importância da capacitação e do conhecimento jurídico na gestão condominial.
1) Qual é o impacto da capacitação profissional na qualidade da gestão condominial e na resolução de conflitos?
A capacitação profissional permite que gestores condominiais compreendam melhor as normas jurídicas, administrativas e financeiras que regem os condomínios, tornando suas ações mais eficientes e fundamentadas. Por exemplo, um síndico que entende de gestão financeira consegue elaborar um orçamento mais preciso e identificar oportunidades de economia para o condomínio, como renegociar contratos ou adotar práticas sustentáveis para reduzir custos.
Um gestor capacitado também desenvolve habilidades para prevenir problemas, como conflitos recorrentes entre condôminos sobre barulhos ou vagas de garagem. Por meio de uma abordagem preventiva e mediadora, ele consegue evitar que situações se agravem.
Na resolução de conflitos, por exemplo, imagine uma disputa entre vizinhos sobre a altura de cercas divisórias. Um síndico com conhecimento jurídico saberá orientar as partes com base no Código Civil e propor uma solução que respeite os direitos de cada um, mantendo a harmonia no condomínio. A capacitação contínua reflete diretamente na confiança dos condôminos, que percebem um trabalho embasado e eficiente.
2) Como o conhecimento jurídico pode auxiliar o síndico a tomar decisões mais seguras e evitar problemas legais no condomínio?
Compreender as leis que regem os condomínios, como o Código Civil, a Lei nº 4.591/1964, as normas da ABNT, além da convenção condominial e do regimento interno, capacita o síndico a agir de acordo com a legislação vigente e evitar decisões que possam ser questionadas juridicamente.
Um exemplo comum ocorre na condução de assembleias: um síndico bem informado saberá diferenciar as decisões que exigem quórum simples das que exigem aprovação qualificada, evitando que deliberações sejam anuladas judicialmente.
Outro exemplo prático é a gestão de contratos. Imagine que o condomínio precise contratar uma empresa de segurança. Um síndico que entende de cláusulas contratuais poderá negociar garantias importantes, como cláusulas de multa por descumprimento ou critérios claros para rescisão contratual, protegendo os interesses do condomínio.
Na cobrança de inadimplência, um síndico capacitado também saberá como proceder de forma ética e legal, evitando práticas abusivas ou omissões que possam gerar ações judiciais contra o condomínio e contra ele próprio.
Da mesma forma, diante de uma gestão de conflitos, o síndico terá como identificar quando é necessário buscar acordos amigáveis ou, em casos mais graves, acionar o Judiciário.
Ou seja, o domínio do aspecto jurídico traz mais segurança para a administração, reduz o risco de penalidades e contribui para a proteção do patrimônio e da harmonia entre os condôminos.
3. Quais temas jurídicos você considera mais relevantes para os síndicos e que merecem mais atenção na sua capacitação?
São aqueles que impactam diretamente a gestão e a convivência condominial. Entre eles:
1. Código Civil e Lei de Condomínios: Conhecer os direitos e deveres dos condôminos e do síndico, bem como as regras para deliberações em assembleias, é essencial para a condução legal das atividades administrativas. Por exemplo, saber os artigos relacionados ao prazo para convocação de assembleias e os critérios para votação, é essencial. Muitos síndicos desconhecem que mudanças estruturais em áreas comuns exigem aprovação de 2/3 dos condôminos.
2. Convenção condominial e regimento interno: Infelizmente, há síndicos que nunca leram esses documentos. Saber interpretá-los evita decisões equivocadas, como permitir atividades que contrariem as normas internas.
3. Contratos com fornecedores: É importante ter noções sobre cláusulas contratuais e as responsabilidades civis decorrentes, zelando pela qualidade dos serviços prestados e evitando problemas futuros. Imagine contratar uma empresa de manutenção de elevadores. Sem avaliar as cláusulas de garantia e responsabilidade, o condomínio pode ficar desprotegido em casos de falhas.
4. Cobrança de inadimplência: O síndico deve agir legalmente, evitando abusos ou omissões que possam comprometer os processos ou até penalizá-lo. Casos de moradores que devem mais de um ano sem ações para cobrança são comuns. O síndico deve evitar atrasos na notificação ou falhas na comunicação com o proprietário do imóvel, como cobrar apenas o inquilino.
5. Questões trabalhistas: A gestão de empregados e terceirizados exige conhecimento sobre direitos trabalhistas e compliance com a legislação vigente. Por exemplo, na contratação de porteiros, é importante garantir que os encargos trabalhistas estejam corretos, evitando ações futuras contra o condomínio.
6. Segurança e manutenção: É imprescindível entender a responsabilidade sobre incidentes em áreas comuns e a necessidade de manter equipamentos em conformidade legal. Equipamentos como extintores e portões eletrônicos precisam de manutenção regular. A negligência pode levar a multas e até processos judiciais em casos de acidentes.
7. Conflitos de vizinhança: Conhecer o direito de vizinhança é essencial para mediar disputas e compreender os limites da interferência do condomínio. Em situações de ruídos ou mau uso de áreas comuns, o síndico precisa saber até onde pode interferir sem violar direitos individuais.
8. Novidades legislativas: Síndicos precisam acompanhar mudanças legais, inclusive no município onde ele mora ou trabalha, em temas como acessibilidade, sustentabilidade e segurança, além de lidar com questões emergentes, como violência doméstica e convivência com animais, ele precisa saber como agir ao identificar um caso.
9. Investir em capacitação contínua nesses tópicos é a chave para uma gestão eficiente, segura e equilibrada.
4) Em sua atuação como palestrante, quais são os principais pontos que você destaca aos síndicos sobre suas responsabilidades legais e suas limitações?
Como palestrante, destaco que o síndico pode muito, mas não pode tudo. Conhecer os limites do cargo é essencial para evitar problemas.
Comunicação: É a base de uma gestão eficiente. O síndico precisa não apenas informar com clareza, mas também ouvir os condôminos, algo que muitos deixam de fazer após serem eleitos. Por exemplo, ao anunciar uma obra, o síndico precisa informar os condôminos sobre prazos, custos e impacto, mas também estar aberto a ouvir sugestões ou críticas. Muitos síndicos falham ao não dar retorno aos moradores, gerando descontentamento.
Ética: Deve nortear todas as decisões, desde contratações até assembleias. Agir com integridade evita que o síndico extrapole suas funções e gera confiança. Cito casos em que síndicos priorizam contratos com empresas por interesses pessoais, o que compromete sua credibilidade. Agir com transparência é essencial para evitar problemas futuros.
Responsabilidade civil e penal: Reforço que o síndico pode ser responsabilizado por omissões, abuso de poder ou má gestão financeira. Hoje, os condôminos estão mais atentos aos seus direitos e não hesitam em cobrá-los.
5. Como você vê o futuro da profissionalização dos síndicos no Brasil e a importância da educação contínua nessa área?
A profissionalização dos síndicos no Brasil é uma evolução inevitável e positiva. Com a complexidade crescente dos condomínios, a figura do síndico deixou de ser apenas representativa, tornando-se a de um gestor multifuncional.
A educação contínua é essencial para acompanhar transformações legais, tecnológicas e sociais, preparando síndicos para uma atuação moderna e eficiente. Essa profissionalização não é um luxo, mas uma necessidade para garantir uma gestão segura, harmoniosa e alinhada às demandas de uma sociedade conectada e exigente.
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